Empreender é uma atividade que exige muito da mente e do corpo. A rotina é corrida, são muitos problemas, decisões difíceis e cobranças constantes. Tudo isso pode gerar um alto nível de estresse, ansiedade, frustração e até depressão. Por isso, cuidar da saúde mental é tão importante quanto cuidar da saúde física e da saúde financeira da empresa.
A saúde mental é um aspecto fundamental para o bem-estar e o sucesso de qualquer pessoa, mas especialmente para quem empreende. Afinal, empreender envolve desafios, incertezas, riscos e pressões, que podem afetar negativamente o equilíbrio emocional e a qualidade de vida do empreendedor.
A saúde mental do empreendedor não afeta apenas a sua vida pessoal, mas também a sua vida profissional. Um empreendedor com problemas emocionais pode ter dificuldades para se concentrar, tomar decisões, liderar equipes, negociar com clientes, inovar e crescer. Além disso, pode transmitir uma imagem negativa para o mercado, investidores e parceiros.
Por isso, é essencial que o empreendedor reconheça a importância de cuidar da sua saúde mental e busque formas de prevenir e tratar os possíveis problemas. Pensando nisso, conversamos com a psicóloga Victória Kofler Puchalski (CRP 07/32976). Ela trouxe reflexões importantes sobre o tema e dicas valiosas. Veja a seguir.
- Como você define a saúde mental e por que ela é importante para os empreendedores?
O termo “saúde mental” é um termo bem amplo, em resumo, podemos dizer que é a forma como uma pessoa lida com as situações do seu cotidiano, gerência e maneja as próprias emoções e pensamentos.
Ter a saúde mental “em dia” é um recurso importante para todos, quando entramos no universo do empreendedorismo, com todas os seus desafios, algumas (ou muitas) imprevisibilidades, necessidade de bons recursos para interações sociais de sucesso, digamos que a saúde mental passa a ser também uma condicional para um negócio próspero a longo prazo.
- Quais são os principais fatores que afetam a saúde mental dos empreendedores, como o estresse, a incerteza, a pressão, a sobrecarga etc.?
Cada indivíduo tem sua história e individualidade, isso proporciona que cada empreendedor tenha como ponto de maior dificuldade um motivo diferente. Os pontos que costumam ser comuns à todos são: a responsabilidade/pressão de ter um negócio sob seu comando e muitas vezes ter colaboradores que também contam com esse sucesso; a imprevisibilidade financeira, já que podemos ter uma “previsão” do quanto a empresa pode faturar, mas dificilmente uma certeza; os altos e baixos do mercado e muitas vezes na procura daquele produto/serviço; a sobrecarga e acúmulo de funções que são rotina na vida do empreendedor.
- Quais são os principais sintomas de sofrimento psicológico que os empreendedores podem apresentar, como ansiedade, depressão, burnout etc.?
Devido às dificuldades citadas acima, é fácil perceber que a vida do empreendedor pode ser permeada de muitos desafios e que sem o suporte adequado e um bom e fortalecido recurso interno para lidar com tanta pressão, é comum que esses profissionais desenvolvam algum grau de adoecimento psicológico. A depressão, ansiedade, Síndrome do esgotamento profissional (Burnout), são psicopatologias que podem acabar surgindo através de uma rotina repetidamente estressante.
- Quais são as consequências negativas do sofrimento psicológico para o desempenho profissional e pessoal dos empreendedores?
Qualquer pessoa em sofrimento psicológico vai sentir o impacto desse adoecimento em todas as esferas da vida, os sintomas não são “criteriosos”, eles aparecem em todos os contextos da vida daquele que adoece. É difícil mensurar qual vai ser o impacto na vida de cada pessoa, são muitos fatores que determinam a intensidade e as consequências de um adoecimento psíquico, mas de forma geral podemos citar a falta de motivação, dificuldade e muitas vezes falta de vontade de manter relações e interações sociais, baixa energia e cansaço excessivo, tensão constante, dificuldades de manter um sono de qualidade, irritabilidade e em alguns casos também surgem sintomas físicos (palpitações, sudorese, tremores, tensão muscular).
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- Quais são as estratégias de prevenção e intervenção que os empreendedores podem adotar para cuidar da sua saúde mental, como o autoconhecimento, o autocuidado, o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, o apoio social, a psicoterapia etc.?
Equilibrar todos esses “pratinhos” não é uma tarefa fácil e muitas vezes o esforço de manter esse equilíbrio é também extremamente adoecedor. Costumo falar que o mais saudável é poder escolher “qual pratinho vou deixar cair hoje?”, esse é talvez o máximo de “controle” que vamos ter. A vida não para de acontecer e ter a impressão que vamos conseguir manter tudo na mais perfeita ordem é um fardo muito pesado a ser carregado.
Se eu posso dar uma dica seria: defina suas prioridades e escolha quais são as que mais precisam de você em cada momento. Não esqueça de se colocar nessa lista.
Um bom exercício é pensar que somos “atendentes” e nossas demandas e prioridades são uma fila, um atendente precisa fazer essa fila girar, algumas pessoas vão precisar de um atendimento mais criterioso, outras vão precisar de um atendimento ágil, mas todas precisam ser atendidas.
Acho que seria um pouco redundante falar da importância da psicoterapia, autoconhecimento, rotina de exercícios, são fatores determinantes para uma vida mais leve. É importante ter a certeza de ter com quem contar.
- Como os empreendedores podem reconhecer quando precisam de ajuda profissional e como buscar essa ajuda?
Nem sempre precisamos esperar sinais de que precisamos de ajuda para buscá-la, quando esses sinais aparecem, já existe uma clareza de que algo não vai bem, muitas vezes o que ainda não surgiu é uma aceitação sobre esse fato. Olhar para a nossa rotina e as demandas e responsabilidades que lidamos é um bom termômetro, “será que dividir essa carga com alguém não tornaria tudo mais leve?”.
Alguém que vive estressado, nervoso, irritado, com medo, tenso, precisa saber que essa não é a única forma de viver a vida. São sensações/sentimentos inerentes a todos nós, mas não é aceitável que sejam os únicos que experimentamos (ou que se sobreponham aos bons).
Como buscar ajuda? Bom, existem alguns meios para isso. Existem os psicólogos clínicos, estes atendem pela via particular e alguns também atendem convênios. A rede pública também disponibiliza psicólogos em seus serviços, nos postos de saúde e também no CAPS (alguns desses locais, infelizmente, contam com filas de espera).
Em cidades universitárias é comum existirem as “Clínica Escola”, local esse onde formandos de psicologia fazem atendimentos a fim de completar sua carga horária de atendimentos para a graduação.
Você também pode procurar alguém que já faça terapia e conversar com essa pessoa, como ela encontrou um profissional, como foram as primeiras sessões, como escolher alguém para começar essa jornada.
Dica extra: costumo brincar que se fomos a primeira sessão e não rolou uma química ou “não foi com a cara do psicólogo”, procure outra pessoa, é imprescindível que aquela pessoa nos gere conforto e quando isso não surge num primeiro momento, que pelo menos nos gere simpatia ou alguma identificação.
- Como os empreendedores podem lidar com o estigma e o preconceito em relação à saúde mental no ambiente de trabalho?
Estamos em um momento onde falar sobre saúde mental deixou de ser algo mal visto e passou a ser um sinal de que a cultura daquela empresa é séria, atualizada e prima pelo bem estar dos seus colaboradores.
Nosso papel, enquanto sociedade, hoje é dar cada vez mais ênfase na qualidade de vida e mostrar que um empreendedor (ou um colaborador) feliz e saudável é também um bom termômetro de desenvolvimento dessa empresa.
Pessoas saudáveis vão ter mais disposição, criatividade e motivação e o ambiente laboral é peça chave. Boa parte do tempo que estamos acordados no nosso dia é envolvidos em questões relacionadas ao nosso trabalho, se esse ambiente é adoecedor, como não adoecer?
- Como os empreendedores podem promover uma cultura de saúde mental positiva na sua empresa, envolvendo seus colaboradores, parceiros e clientes?
Promovendo pesquisas de clima, estando dispostos a de fato escutar e promover ações que sejam benéficas para a empresa e seus colaboradores. Lembrar que a prevenção é sempre um caminho mais fácil e indolor do que uma intervenção em crise.
Deixem claro que a saúde mental naquele ambiente é importante, dê suporte para quem compartilha suas dores, perceba se a maioria das pessoas que trabalham naquele local estão adoecidas, isso pode ser um indício de que algo não vai bem naquele ambiente, estabeleça metas realistas, lembre que feedbacks não devem surgir apenas quando existem problemas, para manter uma equipe engajada é preciso perceber e verbalizar também quando as coisas vão bem.
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- Quais são os benefícios da saúde mental para o sucesso e a felicidade dos empreendedores e equipe?
Sabendo que a vida é cíclica, também não quero passar aqui uma imagem de que tudo deve estar 100% o tempo todo, passamos por momentos de dificuldade, ansiedade e tristeza e poder acolher essas emoções também faz parte da saúde mental.
A verdade é que a pessoa que tem um bom gerenciamento das suas emoções ou a “saúde mental em dia”, como preferirem, não vai estar sempre feliz e não vai ter apenas sucesso, mas vai ter bons recursos internos para lidar com os momentos difíceis e “recalcular a rota”.
Claro, uma pessoa feliz, em um momento de vida tranquilo e sem preocupações, pode ser mais criativa, produzir de forma ágil, ter boas ideias, estar motivado, mas mesmo essa pessoas vai ter um momento de fragilidade ao longo da vida, saúde mental significa que ela vai saber lidar com esse momento também.
- Como identificar situações de perigo e riscos à vida e quem chamar nestes casos de urgência?
Alguns sinais são fáceis de perceber, uma pessoa com comportamento suicida, via de regra passa por algumas mudanças, as principais: falta de interesse em si próprio e no seu autocuidado; mudança nos padrões alimentares e de sono (dorme demais ou muito pouco, come muito ou quase não se alimenta); queda na produtividade (estudos, trabalho, atividades domésticas); tentativa de resolver pendências (fazer as pazes com alguém que não fala a muito tempo, pagar contas, fazer testamento, etc.).
Se você estiver passando por um momento difícil, lembre que esse desejo não é de acabar com a própria vida, é sim sobre acabar com a dor e os problemas que te geram ela. Procure compartilhar com alguém que você confie, peça que essa pessoa te ajude a encontrar um profissional capacitado para passar contigo por essa fase. É UMA FASE.
Você pode ligar para o CVV (188) que é o Centro de Valorização da Vida, através dessa linha você vai receber apoio emocional por voluntários treinados para te escutar em um momento de crise. É também possível procurar pela emergência se você está em risco iminente, algumas cidades contam com emergências psiquiátricas e atendimento especializado.
Não passe por esse momento de vulnerabilidade sozinho, se aproxime de quem te ama e peça ajuda.
Psicóloga Victória Puchalski / Foto: Arquivo Pessoal
Conclusão
Cuidar da saúde mental é um ato de amor-próprio e de responsabilidade social. É também uma forma de contribuir para o desenvolvimento do país, pois um empreendedor saudável é capaz de gerar mais valor, emprego e renda.
Neste mês de setembro, celebramos a campanha Setembro Amarelo, que visa conscientizar sobre a prevenção do suicídio e a valorização da vida. O suicídio é uma das principais causas de morte no mundo, e está relacionado a diversos fatores de risco, como transtornos mentais, violência, abuso de substâncias, isolamento social e desesperança.
Se você está passando por um momento difícil, não hesite em pedir ajuda. Você não está sozinho. Existem pessoas que se importam com você e que podem lhe oferecer apoio e orientação.
Para entrar em contato com a psicóloga Victória Puchalski, basta ligar para o telefone (51)993692135 ou chamar no direct do Instagram @victoriapuchalski. Ela realiza atendimento online para qualquer lugar do mundo e presencial em Camaquã, Rua Capitão Adolfo Castro, n°379, sala 03.
Você também pode entrar em contato com os seguintes canais:
- Centro de Valorização da Vida (CVV): 188 (ligação gratuita) ou chat online.
- Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU): 192.
- Centro de Atenção Psicossocial (CAPS): consulte o endereço mais próximo de você.
Lembre-se: a sua vida vale muito. A sua saúde mental também. Cuide-se!